Muito se discute hoje, principalmente devido a volta do
debate político-ideológico ocasionado pela expansão da internet e a onda
populista de Direita (e mais recentemente, de Esquerda, com a ascensão da
Esquerda populista no México e Argentina) sobre o que é Direita e Esquerda.
No Brasil, essa discussão ganhou voz após o aparecimento - e
não reaparecimento, pois essa Direita não tem nada a ver com a Direita
histórica brasileira, cujas origens eram essencialmente católicas e
reacionárias tanto ao comunismo quanto ao liberalismo - da (Nova) Direita no
país. De repente inúmeras coisas se tornaram sinônimos de comunismo ou petismo
no vocabulário nacional e símbolos um tanto fajutos passaram a ser sinônimos do
conservadorismo direitista. Para mim, esse boom direitista principalmente
devido à internet foi maléfico, talvez o único mérito tenha sido inspirar
debates políticos, porém, devido a essa origem rápida e essencialmente ligada a
debates em redes sociais, o nível deste debate político é baixo.
Muitos dos personagens que discutem conceitos de Direita vs
Esquerda ou mesmo de discussões entre direitistas sobre o que é ser de Direita
não tem a devida preparação literária-bibliográfica para tal discussão. Para
mim há três motivos para isto: a má qualidade do ensino público brasileiro, a
falta de interesse em buscar teoria política e conhecimento histórico-cultural
e a avalanche de informações que dificulta o discernimento entre o que é fato
ou ideologia.
Nas últimas eleições, realizadas a quase dois anos atrás,
tivemos um congresso majoritariamente novo, com uma facção inédita na
assembleia nacional da Nova República: a Direita.
Muitos destes direitistas eram essencialmente bolsonaristas,
não possuíam uma visão metapolítica nem um arcabouço ideológico, basearam sua
campanha e sua visão de mundo em valores vagos de patriotismo e defesa da
família e religião, mas, essencialmente, em termos de realpolitik, estavam lá
para apoiar o que Jair Bolsonaro fizesse.
O jogo político rapidamente rompeu essa Direita
Bolsonarista. Hoje ainda há deputados e senadores bolsonaristas, mas a maioria
mostrou-se na verdade apenas oportunistas que viram uma forma de chegar ao
poder, outros, sob justificativa de serem essencialmente liberais e portanto
verem o presidente que ajudaram a eleger como uma ameaça a esses valores
liberais, tornaram-se uma oposição à Direita, por assim dizer.
Mas, bem, o que se define como Direita?
No Brasil a Direita desde o Império tinha como pilares o
catolicismo apostólico romano, o patriotismo, a oposição ao liberalismo(e com
isto ao americanismo também) e a oposição ao comunismo(e aqui refiro-me ao
comunismo de fato, aos marxista-leninistas e qualquer derivação que for da
moda, como o marxismo-leninismo-maoísmo foi durante os anos 60), além de na
maioria dos casos, a defesa da monarquia. Sob esse pilar conservador posso
citar que tivemos figuras como Gustavo Corção, Arlindo Veiga dos Santos, Plínio
Corrêa de Oliveira, Mario Ferreira dos Santos, Jackson Figueiredo, Plínio
Salgado, Gustavo Barroso, José Pedro Galvão de Sousa e Miguel Reale.
Provavelmente houveram outros autores conservadores, mas confesso que só tenho
conhecimento destes.
Durante os anos 60 a Direita brasileira, que como disse
baseava-se no catolicismo e no anticomunismo, teve seu papel como oposição ao
trabalhismo de João Goulart e de reação ao Partido Comunista e as Ligas
Camponesas. Autores como Plínio Corrêa de Oliveira, Plínio Salgado e Miguel
Reale apoiaram o golpe de 1964 em nome do anticomunismo e do patriotismo. Mas
mesmo assim, nada tinham a ver com a Nova Direita.
Nos anos 80 a Direita brasileira estava em frangalhos, a
maioria de seus autores já haviam falecido e estavam esquecidos, seu nome
estava manchado, associado a ditadura que havia se sustentado no poder por meio
da repressão policial e de atos institucionais durante vinte anos. Plínio
Corrêa de Oliveira fechou-se para círculos católicos deixando de participar da
disputa e do debate político. Miguel Reale preferiu focar em sua carreira como
jurista desde o final dos anos 70, chegando a participar da elaboração da
Constituição de 1988.
Eventualmente o progressismo esquerdista tomou conta do pensamento acadêmico voltado às Ciências Humanas e Sociais e o debate político foi tomado por partidos tradicionais, sem projetos de metapolítica e sem grandes anseios nacionais. Eram sempre os mesmos partidos, sempre os mesmos políticos.
A Nova Direita surgiu um tanto como reação a isto. Por isso ela cospe insultos contra tudo que olha minimamente para a Esquerda e despreza a maioria dos partidos e políticos. Porém, esta Nova Direita nada tem da velha Direita que morreu com o regime que ajudou a parir(o regime militar). A Nova Direita brasileira é algo novo e pior, do meu ponto de vista até mesmo degenerada comparada com sua antecessora.
Estes neoconservadores tem um pensamento essencialmente
liberal. Eles se afundam em literatura e pensadores anglo-saxões como Edmund
Burke, Adam Smith, Ludwig von Mises, Margaret Thatcher, Ronald Reagan, Roger
Scruton, John Locke e outros. Talvez na tradição política-literária anglo-saxã
estes autores até sejam conservadores, mas comparados ao conservadorismo latino
(e nisto me refiro ao conservadorismo das nações católicas da Europa Ocidental
e de suas ex-colônias na América Latina) são liberais.
O conservadorismo latino, e que é de fato o conservadorismo
ocidental, é essencialmente católico e reacionário, reacionário ao liberalismo
dos autores citados. É um conservadorismo voltado a comunidade orgânica que
reinava no Antigo Regime nos países católicos, ao monarquismo tradicionalista,
sem o monarca como uma mera figura e sem um parlamento todo-poderoso para
limitar o monarca, um conservadorismo que tinha suspeitas quanto ao capitalismo
e suas contradições sociais, um conservadorismo que pregava freios e
associações contra o Estado e o mercado por meio de corporações e sindicatos. Um conservadorismo que baseava-se na Doutrina Social da Igreja.
Os pilares da Nova Direita são o americanismo, ou seja, a
obediência as diretrizes estadunidenses de liberalismo econômico e alinhamento
geopolítico ao atual bloco ocidental(América do Norte, Europa Ocidental, Japão,
Coreia do Sul, Austrália, Nova Zelândia, Taiwan e Israel); o sionismo fanático,
em que ignora-se qualquer estudo histórico sobre Israel e sua relação para com
os árabes e persas pois segundo certos pastores este é o povo escolhido e
deve-se defendê-lo cegamente; o protestantismo neopentecostal que incentiva a
defesa ao sionismo, ao americanismo e ao moralismo, utilizando-se das
Escrituras e do desespero do povo frente a miséria em que vivem. Há também
maçons, que são notórios por sua gnose e inimizade com o catolicismo e
nacionalismo antiamericanista.
Com isso, dizem-se liberais-conservadores, mesmo estudando
majoritariamente autores anglo-saxões e liberais; liberais-conservadores cujos
pilares são estadunidenses, incentivados pela Internacional Populista de Steve
Bannon; por think-tanks liberais plantados pelo Brasil no começo dos anos 2010;
por igrejas neopentecostais de origem estadunidense que mal tem 50 anos de existência
e cujo único propósito é propagar o sionismo e apagar o catolicismo nos valores
das nações latino-americanas.
Eles nada conservam dos valores e da sociedade brasileira.
São um retalho ideológico em que se afundam em autores
liberais anglo-saxões enquanto portam retratos de generais do regime militar,
cujo pensamento era positivista e nacionalista apesar dos pesares; apropriam-se
da bandeira monarquista mesmo defendendo o liberalismo e aliando-se a maçonaria
que enfraqueceram o Império e auxiliaram em sua derrocada; enxergam em tudo o
comunismo, mesmo mal tendo ideia do que é o comunismo; defendem Israel e Taiwan
por pura birra com a Esquerda; denunciam qualquer coisa como autoritarismo e
ameaça estatal enquanto defendem a intervenção militar e a ditadura de 64,
incluindo o AI-5, que fora o auge da repressão estatal que tivemos até
hoje.(Ironicamente, adoram tanto o regime militar mas esquecem que Ernesto
Geisel reconheceu a China continental(comunista) como a Única China,
reestabelecendo as relações comerciais e diplomáticas).
Para mim não há nada de conservador nesta Nova Direita. São
todos liberais que servem a interesses anglo-saxões e sionistas. Que se
aproveitam da falta de conhecimento do brasileiro comum para trazer o sionismo
e revisionismo histórico liberal ao seu pensamento. Pouco estudam e ligam para
a História do país e mesmo para as figuras conservadoras que tivemos, preferem
adorar o Tio Sam ou mesmo perder-se em devaneios de poder tomar chá como um
britânico em uma monarquia liberal.
São caboclos querendo ser ingleses.